O Código de Posturas-III
A história dos baldios
Os baldios eram mais ou menos isto. Só que foram plantados pinheiros, muitos pinheiros e eucaliptos. Esta imagem é das Talhadas, no blogue http://bttalbi.blogspot.com/2009_04_01_archive.html, com a devida vénia
Continuamos na história do Código de Posturas da Junta de Freguesia, que estiveram em vigor desde Abril de 1947. Embora extenso, vamos referir um facto histórico com grandes repercussões na freguesia e relacionado com os baldios.
No capítulo II, com o título Património Paroquial, diz o art.º 2º: «Todos os terrenos baldios e de logradouro comum existentes na freguesia são bens próprios da Junta - porque os comprou - e constituem Património Paroquial.»
No final deste artigo há uma nota de rodapé, na qual se conta o seguinte:
«Façamos aqui um pouco de história, porque aos vindouros interessa saber a razão porque esta freguesia dispõe dos seus baldios, nos quais eles podem estender a vista no enlevo de viçosos talhões de arvoredo que ali possuam, a troco de uns míseros tostões que pagam à Junta, enquanto que às freguesias vizinhas não é dado gozar de tal regalia. Pois essa regalia de que hoje [1947] se goza nesta freguesia só se deve às nossas canseiras.
A questão da posse dos baldios vinha de longe e já no tempo da Monarquia, em 1883, uma Câmara houve que deliberou considerar paroquiais os baldios de Macinhata e Valongo. Mas outra Câmara veio que anulou aquela deliberação, por inconsistente, e os baldios continuaram em posse do Município.
Com o advento da República quis o acaso que, como agora, presidíssemos aos destinos desta Junta.
Como sabíamos de sobra que o melhor futuro da freguesia - que é pobre - estava na posse e aproveitamento dos seus baldios, encetámos a campanha pró-posse destes baldios, campanha em que encontrámos sempre o melhor auxílio do velho amigo, Snr. Casimiro de Oliveira Bastos, que então era secretário da Câmara Municipal de Águeda. Mas a verdade é que conversações, abaixo-assinados, representações, etc., tudo esbarrava com a mesma dificuldade: a falta de base legal para o reconhecimento dessa posse. Podia qualquer Câmara resolver esse reconhecimento. Mas, como tal resolução não tinha fundamento legal, outra Câmara viria anulá-lo, como já sucedeu no tempo da Monarquia.
O certo é que esta questão vinha-se arrastando havia já meia dúzia de anos sem se descobrir maneira de legalmente ser resolvida. Contudo, não desistimos de cogitar na maneira de resolver o problema que sempre considerámos de vida ou de morte para a vida económica da freguesia. Até que um dia ocorreu-nos uma ideia, ideia Providencial: A Junta compraria os baldios à Câmara!
Esta transacção era inteiramente legal, mediante o cumprimento de certas formalidades exigidas pelo Código Administrativo então vigente, aliás fáceis de realizar.
Corremos logo a expôr ao então presidente da Câmara e nosso amigo, Sr. Celestino da Silva Neto a nossa ideia, que ele achou genial, admirando que tal não tivesse lembrado a ninguém. (É a história do ovo de Colombo «Muitas coisas fáceis não lembram a toda a gente»).
Obtido o assentimento de toda a Câmara, logo se resolveu o negócio e, cumpridas todas as formalidades legais, tanto por parte da Junta como da Câmara, foram finalmente os baldios desta freguesia adjudicados à Junta, por escritura de 5 de Janeiro de 1917, pela quantia de 200$00 (duzentos escudos).
Dos enormes beneficíos que esta solução trouxe à vida económica da freguesia já hoje ninguém duvida. São muitos miulhares de contos que cá ficam e que, sem ela, veríamos ir para fora, como está sucedendo às freguesias vizinhas, cujos homens - como sempre os houve cá dentro - se permitiram de nos censurar aereamente pela solução que demos ao caso dos baldios. Hoje sentimo-nos largamente recompensados dessas censuras ao ouvir dizer aos mesmos ou aos seus conterrâneos: «As nossas freguesias não tiveram, como a de Valongo, quem cuidasse dos seus interesses e por isso lhe estamos agora a sofrer as consequências, porque os nossos baldios passaram à posse da Junta de Colonização Interna (Florestal), privando-nos assim das grandes regalias que os de Valongo estão fruindo com a posse dos seus».
É esta uma grande verdade, verdade que naquele tempo ninguém via, mas que nós nunca descurámos nem descansámos enquanto definitivamente não conseguimos ver resolvido o magno problema da posse dos baldios da freguesia.
E assim fica narrada, com verdade, a história dos baldios de Valongo do Vouga, para os curiosos que desjem conhecê-la.»
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Como acima referimos, esta é uma nota de roda pé, inserida no Código de Posturas da Junta de Freguesia, de 1947, da autoria do prof. João Baptista Fernandes Vidal, que em 1917 era presidente da Junta ou da Comissão Administrativa. Penso que é de voltar a este tema, para, segundo o meu ponto de vista, descrever algumas facetas ainda vividas na autarquia a propósito destes baldios.
Não tenho a certeza, também não cuidei em confirmar se esta história já aqui terá sido narrada ou não. Se o foi, repete-se para recordar. Se não foi, ainda bem, aqui fica para conhecer.
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