Edificio da antiga Casa Pia, no Porto. Imagem obtida do site wikimedia.org /wikipedia/commons/, com a devida vénia. Para quem conhece o Porto, este edificio está próximo da Praça da Batalha, na Rua Augusto Rosa e era, pelo menos até há pouco tempo, as instalações da PSP. Era até aqui que se deslocava o Dr. Silva Pinho e o seu amigo Dr. José Maria Soares de Albergaria, administrador de Gaia. Este foi o edificício do governo civil do Porto, a que o Dr. Silva Pinho se refere variadas vezes na sua narrativa.
A última postagem sobre esta série histórica, ficou na intimação feita ao administrador do concelho de Gaia e ao Dr. Silva Pinho, para se apresentarem de imediato na Casa Pia (era assim denominada a sede do governo civil do Porto). Também já foi dito que isto era o prenúncio de que este tinha mudado de ideias e de propósitos, face às influências que se teciam por todo o lado e por muitas pessoas.
Lá chegaram ambos. Foram recebidos com alguma indiferença e sobranceria, dizia o Dr. Silva Pinho que o governador estava mais irado do que facundo, conhecendo-se pelo seu aspecto que já não tinha o mesmo sentimento de imparcialidade e de justiça demonstrado na véspera. E disparou de imediato:
- Sr. administrador, ou V. Sª apresenta imediatamente as Meninas Mascarenhas, ou é suspenso por mim e demitido pelo governo. Escolha, sr. administrador.
O administrador hesitou, dizendo a defender-se tíbia e timidamente:
- V. Exª, sr. governador civil, dispõe como entender do meu lugar. V. Exª conhece já a história da chegada a Vila Nova das duas órfãs. Procurei justificar-me e creio que o consegui.
Mas o Dr. Silva Pinho não estava pelos ajustes e pediu licença para dar uma explicação ao Visconde de Valongo, governador civil do Porto. E este respondeu-lhe de imediato:
- Não dou, não senhor. Um cúmplie é um réu e os réus só falam diante dos juízes quando são interrogados. O sr. bacharel e o tutor armaram toda esta embrulhada, por interesse próprio, bem sabe, e agora quer fazer um discurso! Pois não faz nenhum discurso, creia!...
Estas palavras do governador civil do Porto, percebia-se bem, faziam indirectamente alusão a um boato que corria, de que se tinha associado ao tutor para casarem ele com a menina mais velha e o Dr. Silva Pinho com a mais nova. Não era um boato, era um calúnia, dizia este advogado, e os seus amigos, que o conheciam, podiam desmentir esta atoarda. O tempo que decorreu e os factos entretanto verificados, justificaram a sua sinceridade no processo.
Esta alusão do governador fez-lhe subir a indignação que já sentia e não se contendo, mesmo perante a proibição, reagiu e protestou nestes termos:
- Sr. Visconde de Valongo, governador civil do distrito do Porto - falou alto e com voz indignada - a sua alusão não é própria da sua pessoa, como magistrado, e desmerece no seu carácter, como cavalheiro...
O Dr. Silva Pinho estava irado e não sabe se o Visconde percebeu ou não. Só sabe que, nesta altura, este apontando para a porta do seu gabinete, disse timidamente:
- Está finda a audiência. Podem sair.
E saíram...
*****
Duas linhas mais. Por esta redacção, nota-se em que grau de elevada importância se encontrava uma autoridade, como era a de governador civil, naquele tempo. Os modos de diálogo, de trato, outras circunstâncias que os textos deixam perceber, na realidade era quase inacessível um homem que desempenhava a figura de governador civil.
Comparado com as funções e aproximação que hoje se verifica entre esta função e as pessoas e instituições, é mesmo querer comparar o Rossio com a Betesga...
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