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quinta-feira, 4 de fevereiro de 2010

Coisas da Guiné - 23

- 4 de Fevereiro de 1961 -
O princípio da guerra colonial


Palácio do Governador em Bissau (Praça do Império)

Hoje, dia 4 de Fevereiro [1961], é uma data que assinala de «forma oficial» o início da guerra colonial, em Angola, em que Portugal se viu envolvido durante 13 anos. Pouco tempo depois foi a vez da Guiné e de Moçambique.
Foram anos duros, que marcou pela negativa toda uma geração de jovens, com repercussões que ainda hoje influenciam muitas vidas e saúde.
Entrei nessas fileiras, donde muitos desertaram, em Janeiro de 1963. Já expliquei isto.
O que é certo é que já em Julho de 1963 desembarcava na Guiné. E durante dois anos, não «sofrendo» muito, mais pela sorte que por muitos outros factores, de lá saí em Agosto de 1965, chegando a Lisboa em 14 daquele mês e ano, tendo o navio passado já por baixo da ponte a que haviam de chamar «Salazar» e em 1974 rebaptizada de Ponte «25 de Abril» que se mantém.
A minha unidade militar (uma companhia), 'dormiu' em Lisboa e, ao outro dia, por volta das sete da manhã, embarca de comboio em direcção a Chaves, onde tinha sido treinada e formada.
O Batalhão de Caçadores 10 (agora denominado de Regimento de Infantaria de Chaves), foi uma das unidades militares que muita gente preparou e «forneceu» para a guerra colonial.
Percebe-se, hoje, porquê, como outras Unidades Militares ainda existentes pelo país. A geografia local, o mato, os trilhos, os caminhos, tudo era propício ao treino de ambientação militar da guerra de guerrilha. Chaves, tinha tudo para a preparação dos militares nestas acções. Aliás, a guerra de guerrilha foi coisa nova que apareceu no mundo (como agora o terrorismo), logo a seguir ao términos da II Grande Guerra e cujo objectivo era a emancipação e autodeterminação dos povos (países).
Este tipo de acções, de manifesta revolta contra o dominador, quando o dominado não tinha possibilidades, recorria a esta via com o intuito de provocar o desgaste, influenciar psicologicamente e «consumir» estas energias, e as energias económicas do dominador. Porque se sabia que, mais tarde ou mais cedo, o dominador iria ceder.
Foi quase o que aconteceu, porquanto as provas e os historiadores e políticos já antes de Abril de 1974 diziam e escreviam (nalguns casos), que as coisas não poderiam durar muito mais, não fosse a sua antecipação ter surgido com a «revolução dos cravos», como ficou conhecido o 25 de Abril de 1974. Inclusivé, na Guiné, passou a ser notório que a guerra com o PAIGC estaria praticamente e irremediavelmente perdida.
Há muitos episódios que confirmam isso.

No meio de tudo isto, muita gente morreu (da nossa freguesia apenas um faleceu em Angola e, pelo que julgamos saber, de doença. Era da Aguieira.) Muita gente ficou mutilada, deficiente e com outras maleitas para a vida inteira.
Da minha companhia, entre cerca de 130 militares, apenas dois faleceram. Um, José Gonçalves Ruas, 1º cabo de minas e armadilhas, de Penude-Lamego, faleceu em 27 de Agosto de 1964, quando próximo de uma localidade junto à fronteira com o Senegal, chamada Sedengal, foi atingido pelos efeitos de uma armadilha que montava, que desarmou e o atingiu mortalmente.
Naquele dia eu não estava em Ingoré. Tinha ido ao comando de Batalhão, a Bula, e lá soube, pelos camaradas de transmissões, o que se tinha passado naquele local. Nesse mesmo dia e ao princípio da tarde, os meus camaradas da companhia, passaram em Bula a toda a velocidade em direcção a Bissau, levando o corpo do infeliz Ruas, como todos lhe chamávamos. Está sepultado ainda, segundo creio, em Bissau, na campa 1020.
O segundo falecimento foi o do 1º cabo atirador, Artur Branco Gonçalves, de Vilarelho da Raia-Chaves, no dia 13 de Outubro de 1964, no Hospital Militar 241, em Bissau, para onde fora evacuado de helicóptero, por motivo de doença. Está também sepultado em Bissau na campa 1108, admito. A doença que o vitimou, embora não tendo a certeza, terá sido uma úlcera gástrica, que, certamente, pelo seu estado, já não foi a tempo de qualquer intervenção cirúrgica.

Esta e outras efemérides, estou certo que não se apagarão, mesmo que desapareçam todos os protagonistas que nela participaram durante aqueles treze anos.
A este assunto voltarei.

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