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sexta-feira, 31 de julho de 2009

USOS E COSTUMES

AS VOLTAS QUE DÁ O LINHO [i]


Na área da freguesia de Valongo do Vouga, para além de outras culturas, o linho marcou, em tempos não muito remotos, um lugar de evidente preponderância no modo de vida e na sobrevivência familiar.
Agora nada resta a não ser algumas ferramentas próprias que eram utilizadas nas diversas operações antes de chegar ao tear, a descansar em alguns museus locais e das redondezas.
Mas ainda perduram nas memórias as voltas por que passava o linho, antes de andar sobre o corpo de cada homem, feito camisa, ou na cama, feito lençol e ainda em qualquer outra peça de vestuário ou de enfeites em móveis ou sobre as mesas feito toalha.
Quando chegava ao fim do ciclo após a sementeira, era arrancado e ripado. Ia para o “Sadanho” para ser ripada a cabeça onde estava a semente.
Em seguida é atado em molhos e colocado em vasilhas com água, onde ficava de molho durante uns oito dias. A seguir era posto a secar no “tendal”, levantava-se e amassava-se com o maçadoiro à maneira de ficar em estriga.
Depois era estaquinhado (com uma estaquinha). Separava-se a estopa do linho. A estopa era um fio mais grosseiro. Em seguida era fiado.
Após fiado e dobado em meadas, estas eram lavadas, batiam-se na pedra e coziam-se em barrela de cinza, excrementos (bosta) de bovino, urina e, penso, mais alguma coisa que os apontamentos não mencionam.
A seguir a esta operação eram lavadas, colocadas em camadas a corar, até ficarem brancas. Só então é que se podiam considerar aptas a ir para o tear. Do linho saíam ainda aplicações medicianis, como era o caso da linhaça.
A propósito de linho, calha mesmo contar uma lenda demonstrativa do muito trabalho e canseiras que provocava.
Havia uma mulher, que não gostando muito de trabalhar, nunca ia para o rio bater meadas de linho. O seu marido provocava-a com epítetos grosseiros, chegando mesmo à agressão física, a fim de a obrigar a ir para o rio como as outras mulheres o faziam.
Ela, de uma forma subtil, pega em alguns trapos que possuía e resolve ir batê-los para o rio. O marido, desconfiado, vai no seu encalço e a mulher lavava, batia, esfregava, enfim, fartava-se de dar voltas aos trapos. O marido vendo que eram só trapos e não o linho, vai junto dela e dá-lhe mais uma sova, dizendo:
“Março, marçagão, cura meadas e esteiras não”.
Esta lenda era contada para criar em todas as raparigas o hábito e o prazer de preparar o linho. Também se contava quando se queria apontar alguém demasiado lento ou que perdia muito tempo com qualquer coisa sem valor.

(Esta pequena história foi adaptada de um texto elaborado pela Dr.ª Helena Maria Morais de Oliveira, actualmente a residir em Albergaria-a-Velha e docente na Escola Secundária daquela vila, de uma recolha de etnografia e linguagem feita no lugar do Sabugal e Valongo, onde residia, para a disciplina de português do ano lectivo de 1979/1980, da Licenciatura que obteve na Universidade de Aveiro. Este trabalho, manuscrito, pois não havia naquele tempo computadores, tinha 90 páginas, com fotografias e foi classificado de Bom+, do qual nos foi facultada, em tempos, uma fotocópia, que agradecemos).
[i] Sobre o linho, desde a sementeira até ao tecido, clique aqui…

quinta-feira, 30 de julho de 2009

A REGIÃO - VAGOS


Por afinidades com a vila de Vagos, passamos um dia destes por lá e despertou-me a curiosidade dos arredores. Lá fui. Mas não obtive grande êxito não só porque o tempo escasseou (principalmente), como ainda tive o azar de encontrar a maré vazia. Creio que com mais tempo se encontravam por lá alguns cantos que serviam bem para as objectivas das máquinas fotográficas. Para já ficam apenas estas. Mas as de cá não estão esquecidas, antes pelo contrário... Estou a tentar organizar alguma coisa, não muito repetida, por lugares da freguesia.

terça-feira, 28 de julho de 2009

Coisas e Loisas - 2

CONFORME TINHA PROMETIDO, APRESENTA-SE O PROJECTO DE LEI QUE ORIGINOU A PROPOSTA PARA APROVAÇÃO DA ELEVAÇÃO A VILA DA FREGUESIA DE VALONGO DO VOUGA. A SEGUIR AO PROJECTO ESTÁ AINDA O DECRETO DA ASSEMBLEIA DA REPÚBLICA QUE APROVA A ELEVAÇÃO A VILA DA POVOAÇÃO DE VALONGO DO VOUGA. NÃO SÃO NECESSÁRIOS NEM SE JUSTIFICAM MAIS COMENTÁRIOS. O DOCUMENTO FALA POR SI.

Praça de S. Pedro há uns anos atrás

PROJECTO DE LEI Nº. 701/X/4.ª
(ELEVAÇÃO DA FREGUESIA DE VALONGO DO VOUGA, NO CONCELHO DE ÁGUEDA, Á CATEGORIA DE VILA)


Nota justificativa

I – Resumo histórico

Valongo do Vouga é uma área povoada muito antes do século XII.
Efectivamente, já documentos dos séculos IX ao XI referem topónimos que confirmam a ocupação destas terras de “Valle Longum” e “Foramontanos” (Valongo e Fermentões).
Em 897 Valongo era propriedade de Gondesindo Eria, filho de D. Ero c.c. D. Enderquina Pala (1º. deste nome) e de D. Adosinda, que a doaram a S. Salvador de Lavra, onde a sua filha Adosinda era freira.
Em 29 de Outubro de 1101, D. Ximena Forjaz, casada com João Gondesindes, comprou uma parte da herança de Diogo Peres Matrona: “Villas de Valle Longum, Melares e Lanieses” (hoje Lanheses).
Em 1110 Ximena Forjaz, doa Valongo do Vouga à Sé de Coimbra.
No actual território da freguesia de Valongo do Vouga, existiram em tempos, dois concelhos, entretanto já extintos:
a) – Vila de Aguieira, cujo foral foi concedido por El-rei D. Manuel, em Lisboa, aos 6 de Maio de 1514;
b) - Vila de Brunhido, foral também concedido por D. Manuel, em 20 de Março de 1516.
Estes concelhos foram extintos em 1834 com a criação do concelho de Águeda, onde foram integrados.

II – Localização, área e população

Engloba o lugar da sede da freguesia, Valongo do Vouga, e ainda os lugares de Aguieira, Aldeia, Arrancada do Vouga, Brunhido, Cadaveira, Carreiro, Carvalhal da Portela, Carvalhosa, Cavadas de Baixo, Cavadinhas, Covão, Cumeada, Espinheiros, Fermentões, Gandara, Lanheses, Levegadas, Moutedo, Outeiro, Paço, Pedrozelo, Picadas, Póvoa do Espírito Santo, Quintã, Redonda, Sabugal, Salgueiro, Santa Rita, Sobreiro, Toca do Burro, Toural, Vale Covo, Vale das Figueiras, e Veiga.

É a maior freguesia, do maior concelho, do distrito de Aveiro.

Tem uma área de 44,3 km2, com 5.200 habitantes, sendo 4.260 eleitores.

Encontra-se situada no concelho de Águeda, distrito de Aveiro, confrontando a Norte com a freguesia de Macinhata do Vouga; a Nascente com as freguesias de Talhadas (Sever do Vouga) e Préstimo; a Sul com a freguesia de Águeda e a Poente com as freguesias da Trofa e de Lamas do Vouga.

É atravessada pela estrada nacional nº. 573, pela linha do Caminho de Ferro do Vale do Vouga e pela Auto-estrada A 25. Dista um quilómetro do IC2, e dez quilómetros da A1. São boas as suas acessibilidades.

III - Monumentos

a) – Igreja Matriz

Do século XII, foi construída em 1110, confirmada na doação à Sé de Coimbra onde se lê: “nostrum furnum cum sua corte qui est justam illam eclesiam novam”, ou seja, “ o nosso forno, com seu logradouro, que fica junto àquela igreja nova”.

A grande reconstrução que produziu o edifício actual data da transição dos séculos XVII – XVIII.

A pia baptismal, trabalho feito em calcário, é do princípio do século XVI, época manuelina.

Sofreu grandes reformas entre 1930 e 1935.

A imponência da capela-mor, a artística e exuberante talha dos seus altares e a combinação dos mármores e granitos despertam a atenção dos visitantes.

Diversas imagens em pedra de Ançã, gótica, dos séculos XV, XVI e XVII, e em madeira do século XVIII.

b) – Cruzeiro de Arrancada

Tipo templete, de quatro colunas toscanas sobre pedestais, em plano quadrado, entablamento corrido, de estrutura seiscentista.

Sofreu diversas reformas, sendo de calcário a parte mais antiga e de granito a posterior.

Sobre a cúpula há uma pedra paralelepipédica, que numa face mostra um rótulo com data de 1626, noutra uma esfera, e nas outras sinais de emblemas raspados.

c)– Cruzeiro de Aguieira

Datado de 1753, forma templete com colunas avançadas, postas em pedestais. Teve reformas várias, incluindo benfeitorias recentes.

d)– Via Sacra em Valongo e Arrancada

São do princípio do século XVIII.

e) - Capela de Brunhido

Construída no século XVII, possui no óculo da frontaria uma “rosácea”, de calcário dos séculos XIII – XIV, formada por semicírculos secantes, na ordem externa, tangentes na interna e radiação central; os semicírculos externos procuram sugerir entrecruzamento. Exemplar único na Bairrada.

f) – Outras Capelas

Existem capelas em Aguieira ( 2 ), Arrancada ( 2 ), Veiga, Sobreiro, Póvoa do Espírito Santo, Redonda, Salgueiro, Moutedo, Santa Rita, Fermentões e Carvalhal da Portela.

g) – Casas Classificadas

Existem nos lugares de Aguieira, Arrancada e Brunhido diversas casas antigas, com valor arquitectónico, devidamente classificadas pelo Património Nacional.
Com relação às casas de Arrancada, há até uma referência antiga no Arquivo do Distrito de Aveiro, do seguinte teor: “Constitui surpresa encontrar tal número e conjunto de casas dos fins do século XVII aos meados do século XVIII, de tipo homogéneo, em região em que tanto escasseiam as velhas moradias”.

h) – Busto de bronze do fundador da Casa do Povo de Valongo do Vouga.

IV - Características sócio-económicas

Valongo do Vouga, tem-se desenvolvido muitíssimo, sobretudo a partir dos anos setenta, fruto da sua industrialização e da criação e instalação, no início da década de noventa da Escola EB 2/3.

a) – É sede de várias Associações:

- Associação Desportiva Valonguense:
- Casa do Povo, com sala de espectáculos;
- G.D.A. – Grupo desportivo Amador;
- Associação Recreativa da Redonda;
- Fundação de Nossa Senhora da Conceição;
- Centro Paroquial, com grupo de jovens

b) - Segurança Pública

- Posto da Guarda Nacional Republicana, devidamente equipado e com diversos efectivos;

- Carreira de Tiro, do Ministério da Administração Interna, para treino dos efectivos das Forças da Polícia de Segurança Pública e Guarda Nacional Republicana de todo o distrito de Aveiro, no lugar de Toca do Burro.

c) - Protecção Civil

- Secção de Bombeiros Voluntários com viatura sediada de combate a incêndios, com seis efectivos, devidamente treinados pelos Bombeiros Voluntários de Águeda.

d) - Equipamentos e Serviços

- Escola EB 2/3, com 18 turmas, com pavilhão gimno-desportivo;
- Escola EB 1, com 10 salas de aula e cantina, tipo P3, em Arrancada;
- Escola EB 1, com 3 salas de aula, em Valongo;
- Creche com piscina;
- ATL;
- Escola de Música;
- Escola de Dança;
- Grupo Musical;
- Sala de Internet;
- Posto Médico e de Enfermagem, da Segurança Social;
- Farmácia;
- Estação dos Correios;
- Agência bancária;
- Caixas Multibanco;
- Lar de idosos, centro de dia, serviço de apoio domiciliário e apoio domiciliário
integrado;
- Campos de futebol relvados e electrificados - dois
- Campo de futebol sem relva e electrificado;
- Pavilhão gimno-desportivo, na Casa do Povo;
- Pavilhão gimno-desportivo, em construção pela Autarquia;
- Piscina, em construção pela Autarquia;
- Consultórios médicos;
- Escritórios de advogados:
- Irmandade de Nossa Senhora da Conceição
- Laboratório de análises clínicas
- Gabinetes de contabilidade
- Agências de seguros
- Agência funerária
- Livraria
- Praça de táxis
- Rancho folclórico
- Equipas de futebol, andebol e atletismo
- Redes públicas de água, electricidade, telefone, gás e saneamento.

e) - Comércio

- Cafés e restaurantes
- Padarias e pastelarias
- Drogarias e sapatarias
- Mini-mercados e talhos
- Armazéns de produtos alimentícios e agrícolas
- Floristas e massagistas
- Cabeleireiros de homem e senhora
- Bombas de gasolina
- Comércio de bebidas e metais não ferrosos
- Artesanato
- Stands de automóveis
- Armazéns de materiais de construção civil

f) – Industria

- Fabrico de tubos para águas potáveis quentes e frias
- Fabrico de estores e persianas em alumínio
- Tipografia
- Fabrico de fornos para padaria
- Fabrico de material eléctrico e de iluminação;
- Fabrico de móveis metálicos
- Fabrico de móveis de madeira
- Carpintarias e serralharias
- Caixilharia de alumínio
- Divisórias e tectos falsos
- Oficinas de automóveis, motociclos e velocípedes
- Empresas de construção civil
- Serração de madeiras
- Estruturas metálicas
- Caves de vinhos de mesa
- Extracção de areias e saibros.

g) - Transportes públicos

- Serviço regular de autocarros da Rodoviária da Beira Litoral
- Caminho de ferro do Vale do Vouga.
- Transportes escolares pela Autarquia.

Face ao descrito, reúne a freguesia de Valongo do Vouga os requisitos estabelecidos pelo artº. 12º da Lei nº. 11/82, de 2 de Junho para ser elevada à categoria de Vila.

Assim, os Deputados do Partido Social Democrata, abaixo assinados, apresentam o seguinte projecto de Lei:

Artigo Único


A freguesia de Valongo do Vouga, no Concelho de Águeda, é elevada à categoria de Vila.


Palácio de S. Bento, 27 de Março de 2009

Os Deputados do PSD


O DECRETO DA ASSEMBLEIA DA REPÚBLICA PUBLICADO É O SEGUINTE:



DECRETO N.º 322/X


Elevação da povoação de Valongo do Vouga, no Município de Águeda, Distrito de Aveiro, à categoria de Vila

A Assembleia da República decreta, nos termos da alínea c) do artigo 161.º da Constituição, o seguinte:


Artigo único

A povoação de Valongo do Vouga, no Município de Águeda, Distrito de Aveiro, é elevada à categoria de Vila.



Aprovado em 12 de Junho de 2009

O PRESIDENTE DA ASSEMBLEIA DA REPÚBLICA,


(Jaime Gama)




Coisas e Loisas - 1

A ÁREA DA VILA DA FREGUESIA DE VALONGO DO VOUGA

Qual é a área da freguesia de Valongo do Vouga? Ao ser interpelado por esta pergunta, o meu caro bloguista dirá, naturalmente, que não sabe, se for o caso.
Também admitimos que, a propósito deste post e do seu conteúdo, haverá por aí algumas boas pessoas que dirão outras coisas. Sabemos disso. Mas se ninguém a descobrir e denunciar e se, depois de detectado, não houver alguém que reponha as coisas no seu devido lugar, todos aqueles que utilizaram, escreveram e indicaram em documentos oficiais uma área da freguesia que não corresponde, continuarão, certamente, a cair no mesmo erro. E a ficarem convencidos que o seu trabalho está perfeito.

1 - Encontrei nas informações da Câmara que a área da freguesia é de 43,7 Km2. E esta é a área correcta! Pelo menos para nós, que fomos, há já umas dezenas de anos, os autores desta fraseologia ou slogan, até aí pouco ou nada falada e denunciada, que Valongo do Vouga era a maior freguesia rural em área e população.
2 - O projecto de Lei Nº 701/X/4ª, que serviu de proposta à aprovação da elevação a vila da Freguesia de Valongo do Vouga, refere que «tem uma área de 44,3 Km2.»
3 - A informação da internet, na Junta de Freguesia, indica que a área é de 43,2 Km2.
4 - E o site da Wikipédia menciona a área de 39,61 Km2.. Esta área será só para quem lá escreveu esta informação, pois para nós está completamente errada. A menos que não seja a mesma área geográfica. Note-se que esta última indicação vai ao pormenor de mencionar o «0,61», ou sejam 610 metros quadrados, além dos 39.000!

Claro que não pesquisamos mais nada, mas estamos convictos que ainda éramos capazes de encontrar outras medidas para o território da Vila da Freguesia de Valongo do Vouga! E o mais caricato é que cada um dos autores e daquelas fontes, estará, muito provavelmente, convencido que a sua indicação é que é a fonte fidedigna.

Deixamos este reparo pelo insólito que contém, não sendo dirigido a ninguém em particular, a não ser aos intervenientes, como se torna evidente, nas diversas fontes onde constam as áreas não coincidentes.

É preciso muito descaramento para nos andarem a subtrair a área que faz parte da geografia da nossa jurisdição…

segunda-feira, 27 de julho de 2009

A Rega por Aspersão



CAMPOS NA MARGEM DO RIO VOUGA

Há já bastante tempo que não apresentava um slide de fotografias locais. Desta vez entendi que estas eram, para já, bastante interessantes e sugestivas. Parece a mesma imagem, mas não é. Pelos efeitos obtidos, sendo aqui a principal influência a água, entendi que as devia deixar todas, porque todas são diferentes. E cada uma até sugere um título, conforme ficou na apresentação da foto do slide em questão.

As únicas que são quase iguais, são as que identificam, nos respectivos limites, a Vila de Valongo.
Estas fotos, apesar de terem sido publicadas já hoje, dia 27/7, foram tiradas no dia 26 de Julho - domingo, durante a tarde.

A propósito, é oportuno informar que tenho por aí umas dezenas de fotos com a intenção de as mostrar aqui pelo mesmo processo.

Deixem-me seleccioná-las, que depois montarei o slide.

Agradeço a atenção que me têm dispensado, com as vossas visitas.

Até um dia destes, no que respeita a fotos...

sábado, 25 de julho de 2009

LINHA DO VALE DO VOUGA


AS FATÍDICAS PASSAGENS DE NÍVEL

A Refer distribuiu uns folhetos informativos sobre segurança, principalmente direccionado para as passagens de nível, na Linha do Vouga, das quais muita gente tem a sua má recordação. E não são tão poucos quanto isso…
Achei interessante e deixo aqui duas digitalizações de uma parte desse folheto.
Ao mesmo tempo transcrevo ainda o texto que se encontra na página central do mesmo, bem como uma digitalização de um mapa curioso sobre estatísticas das passagens de nível, cuja remodelação ou supressão anda em curso. Diz o texto:

«No final de 2007 existiam na rede ferroviária em exploração 1266 passagens de nível (PN). Na Linha do Vouga, com cerca de 96 Km de via-férrea e 158 PN, a que corresponde uma densidade de 1,66 PN/Km, foram, nos últimos oito anos, suprimidas 118 PN e melhoradas as condições de segurança em 91 das que subsistem.
Não obstante as acções desenvolvidas, regista-se nesta Linha um elevado número de acidentes em passagens de nível.
Para promover uma efectiva redução da sinistralidade nas passagens de nível desta Linha, a REFER tem em curso um plano específico que contempla a supressão de cerca de 50 PN e automatização de 80, pretendendo-se com a sua implementação uma redução de 70 por cento no número de acidentes até ao final de 2011, com referência ao ano de 2006.
Para o sucesso deste plano, cujo investimento ronda os 10 milhões de euros, é necessário o envolvimento das autarquias, com as quais a REFER tem vindo a desenvolver negociações e a estabelecer protocolos de colaboração.»

Mapa de Passagens de Nível por concelho e respectiva densidade por Km.

Se os fatídicos acontecimentos nas Passagens de Nível, com feridos, estropiados e mortos nos fazem meditar no que há muito devia ter sido feito, esta estatística, tal como se apresenta, também faz meditar no sentido de facilmente se descobrirem as suas causas, para ser necessário resolver... o que para muitos é tarde demais... Mas mais vale tarde do que continuar a ignorar o sofrimento e a martirizar...

sexta-feira, 24 de julho de 2009

VILA DE VALONGO DO VOUGA

AS FESTAS DE ELEVAÇÃO A VILA



Deixamos aqui duas imagens sobre as festas de elevação a Vila da freguesia de Valongo do Vouga. Tenho em meu poder, que irei transcrever logo que possível, o projecto de Lei que foi aprovado na Assembleia da República. Para já ficam as imagens.

A foto de cima, tem o programa completo das festividades. A imagem inferior, foi transcrita do site da Junta de Freguesia de Valongo do Vouga.


USOS E COSTUMES

SANTO ANTÓNIO - ARRANCADA DO VOUGA

As festas de Santo António, em Arrancada do Vouga, datam de há mais de trezentos anos. A ermida primitiva, onde é venerado, já não existe. Demolida, foi substituída pela actual, mandada construir pela família Souza Baptista.


A animação das festividades, nos tempos de antanho, tinha por características e atracções principais as grandes peças teatrais, baseadas, muitas vezes, nos autos de Gil Vicente, representados por «artistas» do lugar ou da região. Aconteciam também, com alguma frequência, os espectáculos populares conhecidos por entremezes.
À volta das festividades criaram-se hábitos que, de geração em geração, se transformaram em tradições, que ainda há pouco perduravam, mas que a velocidade e voracidade dos tempos que vivemos as fazem decair e esquecer.

Entre algumas tradições são ou foram de alguma importância como, por exemplo, ter sido criado um livro, que passa de comissão em comissão e no qual além de alguns factos significativos, são registados os nomes dos elementos da Comissão de cada ano e, bem assim, as contas respectivas de cada uma das comissões responsável pela festa. Nalguns casos fica ainda ali colada a fotografia dos membros da Comissão do respectivo ano.

Por outro lado, na altura das vindimas, era contratada uma mulher que, de canado à cabeça, ia de porta em porta colher o vinho mosto que cada um tinha prometido e, logo que estivesse cheio, era despejado nas pipas pertenças da capela (ou do santo?), retomando, como é evidente, a actividade de recolha do mosto.

Mas não pára aqui a tradição. Havia ainda a recolha de outras ofertas, que consistia, numa outra altura, irem de porta em porta, entrando em acção os elementos da comissão de festas desse ano que, por via de promessas, recolhiam os pés de porco e as malgas de milho, percorrendo os diversos lugares da freguesia.

Todas estas ofertas ficavam a aguardar até ao dia de Domingo Gordo, em que, tudo reunido, se procedia à sua venda, em leilão, no adro da capela.

Admito que esta tradição possa estar incompleta. Sei também que o nosso conterrâneo Joaquim de Matos Branco, que mora precisamente na Rua de Santo António, nº 3, em Arrancada, tinha feito um trabalho descritivo completo e exaustivo sobre estas tradições, nomeadamente porque é que se passou a realizar a festa em Agosto e não no dia próprio de Santo António, que é, como sabemos, a 13 de Junho.

quarta-feira, 22 de julho de 2009

USOS E COSTUMES

CANTAR AS ALMAS SANTAS

Tratava-se de uma actividade tradicional de cariz religioso, vivido em algumas freguesias do concelho, na Quaresma, que já Adolfo Portela no seu livro ÁGUEDA fazia referência ao cantar as Almas Santas – Ementar as Almas – Aumentar as Almas, dizia-se.
No mesmo livro vêm ainda transcritas algumas «quadras desirmanadas do cancioneiro» e que eram assim;

À porta das Almas Santas
Bate Deus a toda a hora.
Almas Santas lhe respondem:
- Que quereis, meu Deus, agora?
- Quero que deixeis o mundo
E que venhais para a glória
- Ó meu Deus quem nos lá dera!
Ó meu Deus quem nos lá fora!

Também em Valongo do Vouga, esta manifestação popular, ainda há poucos anos – mas já bastantes – era vivida. Na Quaresma, em algumas povoações juntavam-se várias pessoas e organizavam o grupo para cantar as almas santas. Um era portador da cruz e dois outros ladeavam-na com archotes acesos. O grupo, em dois coros e em diálogo, cantavam aquelas expressões em verso e, ainda, os seguintes que vou tentar organizar em diálogo de um e outro grupo, porque nos apontamentos em minha posse, as frases estão todas seguidas.

1 - Nós preparados estamos,
Ó meu Deus vamos embora.
2 – Na companhia dos anjos
Também da Virgem Maria.
1 – Ó meu Deus quem nos lá dera!
Ó meu Deus quem nos lá vira.
2 – Das almas do outro mundo,
É bem que nós nos lembremos.
1 – Nós havemos de morrer,
Sabe Deus p’ra onde iremos.
2 – Dai a esmola se puderdes,
Se com devoção a dais.
1 – Já lá tendes vossas mães,
Vossos filhos, vossos pais.
2 – A esmola que vós dais,
Não penseis que a comemos.
1 - É para rezar de missas,
A devoção que trazemos.
2 – Temos de subir ao céu,
Por umas continhas brancas.
1 – Dai a esmola se puderdes,
Em louvor das Almas Santas.
2 – Em louvor das Almas Santas
Também da Virgem Maria.
1 – P´las almas, Pai Nosso
Por elas, Avé-Maria

Após cantados os versos descritos, recitava-se o Pai Nosso e a Avé-Maria e era cantada a última estrofe;

Ó bom Jesus do Calvário,
Que lá estais na bela cruz!
Livrai-as do Purgatório,
Para sempre, Amen, Jesus.

Tudo isto era musicado, mas não sei classificar como se define, por não ter qualquer conhecimento da arte dos sons. Mas era sempre a mesma música, em todas as frases, a lembrar um pouco, talvez, o Canto Gregoriano que, parece, era uma música, como se diz agora, redonda, por ser sempre com a mesma construção e entoação. Poderíamos dizer, em linguagem popular, que a música era a lengalenga, mas num tom monocórdico com um certo som triste (ou melancolia) do tempo da Quaresma... E, curiosamente ou não, ainda a sei entoar...
Fica aqui a ideia para a recolha do nosso Grupo de Folclore, da Casa do Povo de Valongo, que tem feito um meritório trabalho.

Pela Internet não faltam elementos sobre esta tradição. Dessa vasta informação, retiro dois ou três locais web, através dos quais se pode ver um, em vídeo, com alguma semelhança na letra, com a que se conhece em Valongo, mas no aspecto cantante muito diferente pois a versão que retenho é mais musical.
Noutros locais, há uma descrição histórica em tudo semelhante ao que aqui se praticava. Os endereços estão a seguir.
Na tradição, pode-se verificar neste endereço, o que consta a respeito das Almas Santas. Pode clicar aqui.
Existem ainda outras descrições da tradição, pelo que pode ver ainda esta, clicando aqui.
Ainda este vídeo, que apesar de algumas deficiências, pode ser apreciado o quanto de semelhante existe no que cantam e no que acima está escrito. Passa-se em Tourigo, concelho de Tondela, não muito longe daqui.






domingo, 19 de julho de 2009

USOS E COSTUMES

SAIAS DAS MULHERES DE ARRANCADA-SÉCULO XVIII

Já não recordo as origens e os motivos, mas sei que um dia descobri no Museu Etnográfico de Mourisca, do Grupo de Folclore da Região do Vouga, uma saia que pessoa amiga, na altura responsável por aquele museu, me mostrou e informou que era uma saia original usada pelas mulheres, em Arrancada do Vouga, aí pelo século XVIII.
Esta passagem aguçou-me de tal modo a curiosidade que não descansei enquanto não obtive do malogrado José Maria Marques (uma das grandes figuras do folclore português, tragicamente desaparecido num acidente de viação, em França, quando regressava da Bélgica, com o Grupo da Região do Vouga, apenas para relembrar) deu autorização para a retirar daquele local (atitude impensável, naquele tempo, por variadíssimas razões que facilmente se deduzem, nomeadamente o valor que a peça representa), com vista a poder conseguir uma reconstituição dessa saia.

Não havia tecido igual ou parecido. Mas havia a possibilidade de, em aparência, poder reproduzir uma saia idêntica, pelo menos em padrão e restantes características. Porque arranjar fio ou tecido igual era completamente impossível.
Com a colaboração da firma António Pereira Vidal & Filhos, Lda., na pessoa do Sr. António Manuel, foi-me conseguido fio de tonalidades aparentes à saia em questão. Conseguido esse fio, fui falar com a nossa saudosa tia Ilda Duarte, da Veiga, que com aquele material lá teceu o pano.

Com aquele pano e com mais outro material necessário, a D. Adozinda, do lugar do Paço, ainda hoje na Casa do Povo de Valongo do Vouga, pelo original, confeccionou umas três ou quatro peças, com as mesmas características. No mais curto espaço de tempo, devolvi o original ao Museu Etnográfico da Região do Vouga, oferecendo ainda, uma das reproduções. As restantes peças reproduzidas, ficaram na Casa do Povo e são actualmente usadas pelas pessoas do grupo de folclore que esta Instituição patrocina e da qual faz parte.

Para quem olhar para a saia, parece que nada de especial tem na sua apresentação. É aqui que se pode ver a diferença, para quem com ela lidar. Era uma saia caída, com cós muito forte, que aperta lateralmente através de uma fita (talvez parecida com nastro) e no fundo da saia um tecido forte e grosso, pesado, para que a saia pudesse, como se diz em confecção, “cair” pelo corpo e bem.

Dessa peças reproduzidas possuo algumas fotografias que aqui deixo para consulta dos admiradores e curiosos destas coisas das tradições. Nessas fotos está uma pessoa muito conhecida em Valongo que uma vez veio a minha casa, e como eu andava de volta deste assunto, pedi-lhe para vestir uma e poder tirar a fotografia que ficasse para a posteridade e a quem, agora, agradeço, porque sinto o benefício do meu pedido e do seu gesto.
E vem a propósito dizer ainda que a certa altura “descobri” que o Sr. Eugénio Fernandes Gomes, nas estantes da sua loja em Valongo, que foi muito conhecida e frequentada, tinha umas peças de cotim, que já não se encontrava em lado nenhum. Feita a proposta a uma das Direcções da Casa do Povo então em exercício (já não lembro qual, mas as actas devem tê-lo registado) foi adquirido todo esse cotim ao Sr. Eugénio e entregue na Instituição, com vista à confecção e reprodução de trajes, nos quais este tecido era aplicado.

quarta-feira, 15 de julho de 2009

Coisas da Guiné - 8

O FADO NA MADRUGADA

Ingoré, Guiné, ambiente de guerra.
Já aqui disse que a minha guerra na Guiné, foi mais o turismo e o pó que se entranhava nas narinas, na pele, na roupa e em tudo quanto era sítio, do que os bombardeamentos, as emboscadas que nunca sofremos (salvo uma “brincadeira” que não sabemos os porquês e que um dia, se se justificar, contarei), os tiros que não demos nem os que nem sequer ouvimos.
Vá-se lá saber porquê. Estávamos lá e não fomos nem mais nem menos que os nossos outros camaradas que também lá estiveram e não podem dizer o mesmo.
Mas, mesmo assim a Guiné, como se diz, também foi sentida, vivida, com paixão, pelas coisas boas, porquanto também nós, sem tiros, estávamos na guerra para construir a paz…
Parece conveniente justificar: é que as populações – mais uma vez as populações – foram sempre a nossa preocupação, na sua vida, no seu modo de vida, nas suas necessidades, sem desrespeitar o que de mais genuíno lhes pertencia… hábitos, costumes, crenças, etc., etc.
Sempre houve, aquilo que se convencionou chamar-se, na altura, psico-social. Isto quer dizer que aquela gente necessitava de nós, no momento mau porque passaram. E nós necessitávamos delas para poder demonstrar a abismal diferença entre guerra e paz, entre vida e morte. Mas compreendíamos, na intimidade, os porquês desta guerra inaceitável e injustificável, como o tempo o demonstrou.

Esta era a torre que o texto refere

Desviei-me um pouco da história que me trouxe aqui. Vamos a ela.
Aquilo que se chamava aquartelamento, em Ingoré, sem luz (só os petromax funcionavam), chegou a ter electricidade durante um ou dois meses e depois os geradores “pifaram” de tal modo, já nem sei porquê, que nunca mais tivemos iluminação eléctrica.
Mas havia a segurança montada, como não podia deixar de ser. Havia uns cibes espetados no chão, com os quais se fez uma torre de vigia (nem sei para quê, pois um bazucada deitava aquela treta e o respectivo pessoal num instante a beijar o chão, isto digo eu, mas dava jeito e provocava uma certa sensação de segurança).
Nessa segurança, de acordo com o local, havia um esquema, como se sabe. No mesmo, havia um posto de vigia que ficava mesmo nas traseiras onde dormia o comandante da companhia. Faça favor de não pôr aqui malícia…
Certo dia, o camarada que ali cumpria a sua folha de serviço, às tantas da madrugada (que bonita canção alentejana, quando fala na madrugada) e toca, para aliviar algum “flato” que o incomodava ou porque se sentia inspirado àquela hora própria de cantar o fado, de entabular cantarolando um qualquer, que já não sei qual foi, mesmo sem acompanhamento de viola ou guitarra. Talvez com os gestos das mãos e dos dedos a G3 as substituísse, mas já não sei...
O que sei é que a sua voz, mesmo melodiosa, acordou o seu comandante.
E este não esteve pelos ajustes, não gostou mesmo de ouvir cantar o fado àquela hora da matina, e toca de, na Ordem de Serviço que se seguiu, sentenciar, sem apelo nem agravo, uns dias de detenção (detenção na Guiné, meus amigos!) como prémio para o tom afinado com que acordou o capitão da companhia!
Tristes fados, tristes sinas…

terça-feira, 14 de julho de 2009

Coisas da Guiné - 7

A MALOGRADA EMBOSCADA

Decorria o ano de 1964. Existiam informações que davam conta da passagem, parece que habitual, por caminho certo e conhecido, de um grupo IN, num cruzamento da estrada entre Ingoré e Barro.
Era conhecida a existência desse corredor. A sul, a margem direita do Cacheu, a norte a estrada Ingoré - Barro. Passada esta estrada a meia dúzia de quilómetros estava a fronteira com o Senegal, e Ingorézinho a poente. Era, portanto, um interessante e seguro corredor…
Durante o dia e com a descrição possível foi feito o reconhecimento ao local. Tomadas as devidas providências e elaborado o respectivo plano, a refeição foi servida bastante cedo, pouco depois das 16 horas, e partimos transportados nas viaturas.
Nada de anormal até aqui. O que vinha a seguir estragou tudo.


Neste local fazíamos abastecimento de água potável. Chamava-se Fonte Longa de Ingoré. Passados anos, outros colegas chegaram a ser emboscados aqui quando iam buscar água. Era uma das únicas nascentes de água doce ao redor de vários quilómetros.
A certa altura, viaturas regressadas, todo o pessoal ia em direcção ao local, apeados.
Como já era hábito e conhecido, quando no horizonte se via um ponto negro, já sabíamos, havia borrasca. Passada meia hora, se tanto ou pouco mais, desaba tamanho temporal tropical, escurece rapidamente, que não se enxerga nada a menos de um metro de distância. A técnica já conhecida, para não nos perdermos, foi seguir caminho, qual carreirinho de formigas, ligados uns aos outros com a mão direita (ou esquerda) agarrado ao casaco do camarada da frente.
A chuva descarregava a cântaros, os relâmpagos eram um espectáculo constante a iluminar electricamente toda a região, nos pés a lama já pesava mais que as botas, os trovões ribombavam constantemente e com um barulho ensurdecedor pior que os canhões e obus. As descargas eléctricas e os estampidos destas em redor eram mais espectaculares que qualquer fogo-de-artifício de S. João.
E lá fomos. Voltar atrás, não, o temporal, como os outros, havia de passar…
Até que a certa altura, no meio do breu, o capitão manda o pessoal parar. E refere que lhe parece que é ali o local onde a operação de emboscada a um grupo IN devia ser montada.
O dispositivo das forças foi distribuído, com o esquema adequado já delineado, partindo do princípio que estávamos no local correcto. E a noite ia passando e cada grupo ou apenas um, como eu, no seu esconderijo e abrigado, lá ia esperando pelo momento e vendo as horas passar. Mas nada…
Coube-me ficar num local, do qual só recordo, quando a manhã raiou, que era debaixo de uma árvore, de porte e altura enormes. E aquele temporal, com aquela trovoada tropical, naquela árvore! Que inconsciência, meu Deus! Que sorte, nenhum raio se lembrar de se atirar àquela árvore a umas boas dezenas de metros de altura e por ela descer. Certamente que o filho do meu pai ficava ali frito que nem churrasaco. Foi um alívio… e sorte.
Ao raiar a aurora, o capitão dá ordem de reunião, lá nos juntámos na estrada, com lama de palmo, e fomos verificar a zona. Pois é verdade, o cruzamento lá estava, as pegadas e muitas provaram que pessoas por lá passaram, só que ficamos cerca de 150 metros acima do cruzamento!
Nós não demos pela sua passagem e eles não deram pela nossa presença…
Foi assim a emboscada que se malogrou…

sábado, 11 de julho de 2009

Coisas da Guiné - 6

DOMINGOS A CRIANÇA MASCOTE


Agora, quando quero escrever uma história sobre o Domingos, faltam-me as palavras, os verbos e é difícil juntar as sílabas.
Ainda me estão a martelar na cabeça as palavras escritas pelo Engº Pedro Moço, funcionário de uma empresa do grupo Soares da Costa, que, recordo o que disse atrás, esteve 18 meses na Guiné, fazendo parte da equipa que dirigiu a construção da ponte “Euro-Africana”, mas para nós a sempre ponte (onde foi jangada) de S. Vicente. Dizia então:

«Penso que qualquer cidadão europeu devia viver em África, pelo menos 6 meses, para poder dar valor ao que tem disponível no seu país, coisas que para qualquer europeu são banais, tais como, o direito à saúde, educação, o poder dispor de electricidade, água potável, etc., etc. Aqui nada existe, a não ser a tentativa de sobrevivência do dia-a-dia.

Dói a ausência de futuro nos olhos das crianças, dói o nulo investimento na formação, na educação, dói o tipo de vida resignada, dói que a única solução seja emigrar, ainda que precariamente. Dói que o eldorado esteja sempre do lado de lá. Dói pensar nas desilusões de quem passa para o lado de lá e encontra o que não esperava. Dói a ausência de futuro e de estratégias de desenvolvimento. Dói que se morra de “coisas da Guiné”, espécie de doença generalista que agrupa tudo o que mata e se desconhece.»
(O Domingos, encostado à cama, de cócoras, com capacete, ao lado direito dos militares)

Vamos ver a história. O Domingos era uma criança, em 1964. De estatura normal para seus cinco, seis, sete anos, os seus olhitos parece que estavam sempre em permanente melancolia (como os de muitos putos guineenses), mas o seu porte e presença eram já um tanto diferentes.
O Domingos, fazendo fé nas recordações um tanto esfumadas e que o tempo não perdoa, porque não é eterna a sua permanência nas imagens cerebrais de cada um, começou a aparecer com a mãe, que lavava a roupa de alguns militares e que constituía até alguma fonte de sobrevivência para a família.
Tantas vezes lá foi que começou a ter contacto com os militares e que, pelo seu feitio e postura simpáticos, afáveis para uma criança daquela idade, ficou lá connosco um dia, depois, talvez outro e outro, todos o acarinhavam e brincavam com ele e o Domingos ia demonstrando alguma sociabilidade e integração, retribuía, na sua mente de criança de tenra idade, a simpatia pelo trato que lhe ia sendo dispensado.
Até que, para não alongar mais a lengalenga, o Domingos foi adoptado oficialmente como mascote da CCaç. 462. Passou a ter uma farda igual à nossa, com excepção do camuflado e do vestuário de trabalho e nunca teve arma, nem havia permissão nossa para delas se abeirar. Comia connosco, e durante muito tempo chegou a dormir na caserna como todos nós.
Os pais sabiam desta situação, o comandante da Companhia também. Nada de fazer as coisas, com crianças, que fossem bulir com os “cânones” ou com a moral, a responsabilidade, e todos os outros adjectivos inerentes à situação.
Por isso o realce que dei às palavras do Engº Pedro Moço e que peço voltem agora atrás e releiam o primeiro parágrafo. Sobre o seu conteúdo e significado de vida, muitos de nós, estejamos onde estivermos hoje, sabem, conhecem e viveram esta situação, com outros Domingos da Guiné…
É aqui que cabem as palavras do Engº Pedro Moço: «Dói a ausência de futuro nos olhos das crianças, dói o nulo investimento na formação e na educação…» é a síntese mais completa daquilo que ainda muitos não experimentaram na sua vida! Por cá, até se levam e vão buscar as crianças à escola e aqui são alimentadas! Na Guiné, se havia escola, era uma escola vazia de tudo, até nos estômagos...
Depois que, ao fim de dezasseis meses, fomos “embalados” e enviados para Bula, perdemos o rasto do Domingos. E mais o perdemos quando fomos ocupar, pela primeira vez, o território de Có, Ponate, Jolmete e Pelundo, ali na zona de Teixeira Pinto, hoje Cachungo. Perdêmo-lo definitivamente, quando destas localidades fomos para Mansoa.
E nunca mais nada se soube do Domingos, aquela criança (negra) simpática e meiga, de olhos melancólicos, mas doces, que viveu connosco durante algum tempo, quando regressamos no Niassa…
Fica, ao menos, a única foto que tenho dele…

sexta-feira, 10 de julho de 2009

PAPA BENTO XVI RECEBE BARACK OBAMA

Fazemos um pequeno desvio editorial do blogue para apresentar esta notícia.
O Papa recebeu pela primeira vez o presidente dos Estados Unidos, Barack Obama e sua mulher, assim como alguns membros da comitiva.

Gostaria que os meus visitadores leiam a notícia e vejam o vídeo clicando aqui... na Ecclesia.

E gostaria ainda que estivessem atentos aos barulhos de ambiente, principalmente o matraquear provocado pelos instrumentos dos fotógrafos que se evidenciam mais no momento em que o Papa e o presidente dos Estados Unidos se aproximam de uma mesa, talvez para a protocolar troca de lembranças...

Este barulho é estranho e faz lembrar qualquer coisa...

"É uma grande honra para mim, muito obrigado", disse o presidente norte-americano, quando cumprimentava o Papa, mesmo antes de conversarem sobre a cimeira do Grupo dos G8 que foi muito produtiva, segundo Obama.
"Deve estar muito cansado, depois destes encontros", respondeu Bento XVI. O encontro entre ambos decorreu na biblioteca privada do Papa e durou cerca de 40 minutos. Como era prevísivel, foi abordado entre ambos as perspectivas de paz para o Médio Oriente, sobre a qual há uma convergência de posições, nomeadamente no que respeita a outras situações da região. No cerne do encontro, segundo as fontes oficiais do Vaticano, estiveram os temas da política internacional, na sequência dos resultados da cimeira do G8.

sábado, 4 de julho de 2009

Coisas da Guiné - 5

GUINÉ – A PONTE DE S. VICENTE
Designação Oficial: Ponte Euro-Africana


Foto da Ponte de S. Vicente-foto Engº Pedro Moço (Soares da Costa abr2009)

Actual Ponte de S. Vicente (foto Missionário Italiano)

Penso que qualquer cidadão europeu devia viver em África, pelo menos 6 meses, para poder dar valor ao que tem disponível no seu país, coisas que para qualquer europeu são banais, tais como, o direito à saúde, educação, o poder dispor de electricidade, água potável, etc., etc. Aqui nada existe, a não ser a tentativa de sobrevivência do dia-a-dia.

Dói a ausência de futuro nos olhos das crianças, dói o nulo investimento na formação, na educação, dói o tipo de vida resignada, dói que a única solução seja emigrar, ainda que precariamente. Dói que o eldorado esteja sempre do lado de lá. Dói pensar nas desilusões de quem passa para o lado de lá e encontra o que não esperava.Dói a ausência de futuro e de estratégias de desenvolvimento. Dói que se morra de “coisas da Guiné”, espécie de doença generalista que agrupa tudo o que mata e se desconhece.

(Eng. Pedro Moço, empresa Soares da Costa, técnico da área de geologia que dirigiu a construção, na Guiné, da ponte de S. Vicente, no blogue psvicente.blogspot.com)

Ponte de S. Vicente (Cacheu) em construção-Ao fundo a estrada para Ingoré ou Bula
Ponte Rio Corubal (Saltinho?)
Este post abre com as palavras de Pedro Moço, um técnico que pertence, na área acima indicada, ao grupo Soares da Costa.
Com ele tive o privilégio de trocar uns mailes, nos quais ele me ajudou a identificar uma fotografia da Guiné que tenho em meu poder e que me parecia uma ponte do Rio Mansoa, perto desta localidade.
A minha companhia (CCaç 462) esteve aqui escassos meses, ou semanas, antes do seu regresso.
Por força das funções que tinha por apêndice e que já aqui esclareci, não fui para Mansoa, ficando a trabalhar em Bissau.
Mas alguém me fez chegar aquela fotografia. E sempre me ficou a ideia de ser uma ponte sobre o Rio Mansoa. Mas não…
Acabamos por concluir que esta ponte ou outra muito parecida (o que seria um tanto inacreditável) está no Rio Corubal (de que tenho por aqui, agora, algumas) e foi da autoria do Engº Edgar Cardoso, que também assinou a construção da ponte da Arrábida, no Rio Douro, ali ao chegar ao Porto.
Esclarecida esta situação, a história agora é outra…
Trata-se da ponte sobre o Rio Cacheu, ali mesmo em São Vicente!
Aquele engenheiro geólogo (não gosta que o tratem assim, mas estamos a falar em contextos profissionais!) durante dezoito meses esteve na Guiné, em anos recentíssimos, e deixou-nos aquela prosa, que pode ser confirmada em http://psvicente.blogspot.com./ o blogue que criou exclusivamente para historiar a evolução da construção da ponte.
Não faço comentários, porque as suas palavras, sentidas e honestas, deixam antever a câmara do que lhe vai na alma, relativo àquele território e àquelas gentes e à sua vida cheia de necessidades. E dizia-se, naquele tempo (1963-1965), que na Guiné era impossível a construção de pontes, por causa do terreno. Pois é, as estacas (ou pilares, ou lá como se chama, com toneladas de ferro e cimento) estão a muitas dezenas de metros de profundidade, mais ou menos a 35 metros, não confirmei, mas também não vale a pena…
E trago isto à colação, porque uma grande parte daqueles que estiveram na Guiné, esteve no meio do rio Cacheu, para se proteger durante a noite quando fazia guarda à jangada, durante o dia, portanto 24 horas; aquela ponte substituiu este meio de ligar uma à outra margem; atravessamos aquele local dezenas de vezes e, durante o tempo de guarda e vigia, também passamos os melhores momentos (pelo menos naquele tempo), quando nos deliciávamos com os petiscos que íamos cozinhando, ao fim da tarde, nomeadamente os belíssimos e enormes caranguejos (e outros apetitosos crustáceos) que ali eram apanhados da maneira mais simples; um arco de pipo, um bocado de rede e umas taliscas de bacalhau presas à rede, que tínhamos de "subtrair" ao armazém do Vagomestre (ele sabia) furr.mil. Ernesto Milton Patrício, que era natural de uma vila de Trás-os-Montes (um dia destes venho a lembrar-me).
A inauguração desta ponte foi feita em 19 de Junho último, tem 730 metros de comprimento e foi concluída em 3 de Abril de 2009. Quanta falta nos fez esta e outras pontes, neste e em outros locais! Sei que isto é um bocado de poesia, mas…
As fotos que acompanham esta história, sendo a sua utilização autorizada pelo Eng.º Pedro Moço, são recentes, como é evidente, e retratam a ponte já pronta. Há uma terceira que terá sido obtida através de um missionário, italiano, que faz uma descrição de uma viagem e consta no blogue http://didinho.org/uma_viagem_especial.htm,descrição essa do que passou do Senegal para a Guiné. Curiosamente, da seguinte forma; estando em Zinguinchor, rodou para nascente ao longo da fronteira e entrou na Guiné a norte de Bigene, segundo o mapa pelo próprio desenhado. Passado todo este tempo, e conhecendo toda aquela área, eu diria, facilitando, que, estando em Zinguinchor (uma cidade a norte de S. Domingos, onde já se ia em 1963, 1964, etc., e há por aí blogues com relatos dessas deslocações), aquele homem podia vir a esta localidade fronteiriça da Guiné (mais directo) e depois por ali abaixo (ou por ali acima, porque na Guiné é difícil dizer isto), vinha a Sedengal e a Ingoré e depois S. Vicente, Bula, etc. Isto porque a descrição da sua aventura é datada de Maio de 2009 e nela está mencionada a fotografia que agora é justificação deste post.Entretanto foram construídas outras pontes no atravessamento dos cursos de água (e muitos) na Guiné, para permitir abrir ao trânsito uma estrada Trans-Africana, que vai de Marrocos até, salvo erro, à Libéria.

Resta acrescentar que na Guiné, em 1963, apenas existiam ou eram conhecidas uma ou duas pontes.
UMA CORRECÇÃO: - É meu dever, porque foi omitido em post's anteriores involuntariamente o nome de um conterrâneo que também esteve na Guiné e, em tempos, lá fez uma visita. Trata-se de Manuel Francisco Rodrigues Simões, da Póvoa, que, se disser que é o Manuel do Talho, todos ficam a saber quem se trata. Fica reposta a referida omissão.



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