Há quase um mês que não tínhamos voltado aos capítulos, adaptados, da história das Meninas Mascarenhas, cujo livro foi editado pelo jornal paroquial «Valongo do Vouga» de que era Director o Rev. Pe. António Ferreira Tavares. O último foi no dia 31 de Agosto findo. Ficamos no esconderijo que madame Mesnier tinha "montado" para poder salvar o Dr. Joaquim Álvaro, que tinha aguentado com três colchões às costas. E terminávamos a dizer que tinham batido à porta e que, certamente, era a polícia. E era...
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Não sabemos se a cama era idêntica ou não. Esta é do séc. XIX do blog Emule.com.br
Madame Mesnier tinha mandado abrir todas as portas dos diversos compartimentos que o edifício possuía. Comandava esta patrulha o Dr. Resende, amigo dos Bandeiras, médico, de Aveiro e bastante conhecedor da família Pacheco Teles, de Aguieira. Aquela cidadã francesa acompanhou o chefe da patrulha policial na sua busca.
Viram tudo o que pretenderam e quando chegaram àquele compartimento, a senhora adiantou-se na informação e disse que aquele era o seu quarto de dormir. O Dr. Resende olhou apenas e não entrou, seguindo a pesquisa.
Mas, um pouco mais tarde, ao descer do andar superior e passando de novo à porta do quarto antes visto, o Resende, sem pedir licença e sem qualquer explicação à dona da casa, entrou e começou a remexer e a revistar o guarda-fatos, o sofá e debaixo da cama. A dona da casa assistia demonstrando aparente ar de indiferença, aguentando o que sentia rugir no seu peito.
Então o exame tornou-se mais apertado e o Dr. Resende levantou o primeiro colchão. Em seguida levantou o segundo e a cama começou a ficar um pouco desarrumada e amarrotada, quase totalmente descomposta. Ele ia a deitar a mão ao terceiro colchão e é intercedido nesse momento por madame Mesnier que, demonstrando alguma encolerização, estende o braço e exclama o que a seguir respigamos:
- Basta! Não se devassa assim o leito de uma senhora estrangeira! Só neste país é que isso é permitido. Em França não se procede deste modo. Oh! a galanteria portuguesa!... a galanteria portuguesa!...
Perante esta reacção, o Dr. Resende que se mostrava um homem com apresentação de trato fino e educado, desejava, mesmo assim, passar por cavalheiro e leal, e logo que acabou de ouvir aquela voz indignada e sentida de madame Mesnier, recuou na sua atitude, fez um gesto de arrependimento e de desculpa. E transcrevemos a resposta:
- Minha senhora, o seu desgosto e a sua cólera são justificados. Esqueci-me, por um momento, de que estava nos aposentos de uma senhora. Essa senhora é bastante generosa para me perdoar uma irreflexão do meu espírito conturbado.
O médico fez os gestos de cortesia da época e lá se foi. Madame Mesnier tinha triunfado! E o seu plano, que tinha sido rapidamente concebido teve um brilhante êxito. Joaquim Álvaro, saído da incómoda mas segura posição mostrava-se contentíssimo, agradecendo àquela senhora e dizendo que nunca mais se esqueceria de que o salvou de uma situação apertada e arriscada.
Madame Mesnier é que pediu desculpa por tê-lo obrigado a passar um longo quarto de hora debaixo de colchões, arriscando a vida por asfixia. Pedia desculpa pela crueldade, acrescentou.
Continua o diálogo de agradecimentos entre os dois e dizia o Dr. José Joaquim da Silva Pinho na sua narrativa deste episódio, que não se faz ideia da sua alegria ao ouvir contar isto numa linguagem animada e fácil de Francisco Veloso da Cruz, residente em Vila Nova de Gaia que, recorde-se, era amigo deste e do Dr. Joaquim Álvaro.
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